O Reino Unido decidiu por meio de referendo realizado no dia 23/06/2016 deixar a União Europeia. Os reflexos imediatos da decisão foram a renúncia do primeiro-ministro James Cameron, a desvalorização da Libra e a forte queda das bolsas de valores ao redor do mundo.
O futuro da União Europeia está ameaçado. A saída do Reino Unido poderá gerar uma onda de pedidos de plebiscitos em outros países e decretar o fim de uma experiência inacabada da construção de um Estado supranacional.
Afinal de contas, o que é a União Europeia?
A Comunidade Europeia representa uma das mais bem sucedidas empreitadas de integração regional ocorridas até os dias de hoje; observada pela construção da sólida estruturação do mercado comum, passando pela conjugação econômica e monetária, pela política externa e de segurança únicas, pela cooperação em matéria judiciária e, ao final, pela verdadeira união política[1].
A convicção de que a Europa constitui uma individualidade histórica, com valores próprios que precisam ser preservados e dotada de um destino comum a ser compartilhado, “representam forças poderosas a motivar os países para a consecução do empreendimento europeu”[2].
Como observa Maria Helena Diniz[3], a União Europeia foi criada com o objetivo de atingir a livre circulação de pessoas, de bens, de capitais e serviços; para tanto, os países-membros renunciaram parte de sua soberania em favor da Comissão Europeia, a quem compete promulgar atos europeus equivalentes à legislação doméstica.
O Dicionário de Política organizado por Norberto Bobbio afirma que a “Unificação europeia é, portanto, um processo que tem características ambíguas: constitui, ao mesmo tempo, a última fase da crise do Estado nacional e a primeira fase de sua superação”[4], podendo ser definida como “o processo histórico no curso do qual a sociedade civil perde seu caráter exclusivamente nacional e adquire, juntamente com o caráter nacional, um caráter europeu”[5].
Os primeiros projetos de integração dos países europeus surgiram no período entre guerras e tiveram como pano de fundo a Liga das Nações[6]. Após décadas de experimentações e inovações, a União Europeia, denominação que passou a ter a partir de 1993, hoje possui uma estrutura institucional supranacional independente para a realização de seus objetivos, são eles: Conselho Europeu, Conselho da União Europeia, Comissão Europeia, Tribunal de Contas, Tribunal de Justiça e Parlamento Europeu.
O Conselho Europeu, responsável por definir os objetivos da União, as diretrizes que orientam as políticas comuns e as orientações que serão concretizadas nos seus vários domínios, ocupa-se de questões relacionadas ao aprimoramento das instituições e a política externa e de segurança comum; e, também, perseguir a superação de eventuais divergências entre os Estados e debelar crises que vierem a surgir[7].
O Conselho da União Europeia – difere do Conselho Europeu, este o foro de cúpula da União que estabelece as orientações de caráter geral – é um órgão colegiado de representação dos interesses estatais e a principal instância decisória no âmbito comunitário, a quem compete, dentre outras atribuições, coordenar as políticas econômicas dos Estados-membros, definir a política externa e de segurança comum da União Europeia, além de adotar medidas sobre a cooperação policial e judiciária para combater o aumento da criminalidade[8].
A Comissão Europeia é órgão colegiado integrado por nacionais dos Estados-membros, nomeados pelos governos. Sua missão é garantir o respeito das regras comunitárias e dos princípios do mercado comum, propor ao Conselho Europeu todas as medidas consideradas úteis para o desenvolvimento das políticas comunitárias e executar políticas comunitárias a partir dos dispositivos dos tratados[9].
O Tribunal de Contas tem como objetivo efetuar o controle das metas orçamentárias e examinar se os órgãos comunitários cumpriram as previsões de gastos constantes no orçamento[10].
O Tribunal de Justiça, órgão independente em relação aos Estados-membros e às demais estruturas institucionais comunitárias, atua firme no propósito de manter íntegra a ordem jurídica das Comunidades e notabilizou-se por proferir interpretações finalísticas, que fortalecem o processo de integração e alcance das regras elaboradas pelos órgãos comunitários[11].
Com o intuito de preservar o espírito e a letra dos tratados fundadores, o Tribunal de Justiça age frequentemente como verdadeira Corte constitucional, além de possuir competência ampla, que recobre a área internacional, administrativa, comercial, cível e trabalhista; também compete a ele o controle de legalidade dos Estados-membros e das instituições comunitárias[12].
O Parlamento Europeu representa os povos dos Estados-Membros, de acordo com o peso demográfico, e a eleição de seus membros é feita pelo sufrágio universal direto e periódico, em escrutínios realizados em todos os países membros da União Europeia[13].
O Parlamento Europeu é composto por 785 deputados que debatem e aprimoram as propostas encaminhadas pela Comissão Europeia, que detém o monopólio da iniciativa normativa. O Parlamento, também, exerce amplo controle sobre as atividades das demais instituições da União, inclusive o controle econômico e monetário. Possui, ainda, a prerrogativa de criar comissões de inquérito em situações que envolvam violação do direito comunitário[14].
Notas
[1] CASELLA, Paulo Borba; ACCIOLY, Hidelbrando; SILVA, G. E.do Nascimento e. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 20ª ed., 2012, p. 469.
[2] AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas, 2008, p. 421.
[3] DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 2009. Vol. 4., p.761
[4] BOBBIO, Norberto; MATEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Trad. Carmen C. Varrialle, Gaetano Loiai Mônaco, João Ferreira, Luis Guerreiro Pinto Cacais, Renzo Dini. Brasília: UnB, 11ª ed., 1998, Vol. I, p.1269.
[5] Ibidem, p. 1271.
[6] AMARAL JUNIOR. Op. Cit., p. 421-422.
[7] AMARAL JUNIOR. Op. Cit., p. 427-428
[8] AMARAL JUNIOR. Op. Cit., p. 431.
[9] CASELLA, Paulo Borba Op. Cit., p. 472-473.
[10] AMARAL JUNIOR. Op. Cit., p. 433 -434.
[11] Ibidem, 434.
[12] Ibidem, 435.
[13] CASELLA, Paulo Borba. Op. Cit., p. 472.
[14] AMARAL JUNIOR. Op. Cit., p. 430